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Entrevista da Dra. Marielle Brito para a matéria do portal Jurídico O Jota

advogado-de-familia-brasilia-dfPublicado em 12/10/2016
Sem proveito para os filhos, destituição do poder familiar dos pais é negada pelo STJ

Qual o objetivo da destituição do poder familiar, prevista no artigo 1.638 do Código Civil, se esse ato não traz proveito real para as crianças – mas, ao contrário, poderia acabar com as poucas possibilidades de um tardio reagrupamento familiar?

Esta foi a provocação debatida pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que analisou o caso de uma família composta por quatro filhos, pai e mãe. Diante do abandono das crianças, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul ajuizou, em 2012, ação de destituição do poder familiar em desfavor dos pais.
No voto da ministra Nancy Andrighi, relatora do Recurso Especial 1.627.609/MS, os efeitos da destituição do poder familiar foram levados em consideração. Para ela, nesse caso, a ação não seria benéfica às crianças.
“Qual o objetivo, hoje, da destituição do poder familiar – hipótese no mínimo controversa – se esse fato não redundará em proveito real para os menores, mas ao revés, soterrará as poucas possibilidades de um tardio reagrupamento familiar? ”, questionou a ministra, durante o julgamento realizado no dia 4/10.
Um dos quatro filhos do casal é maior de idade, tem 19 anos. Todos eles, inclusive, já estão na adolescência: um completará 17 anos em janeiro de 2017, outro fará 15 anos e a mais nova, 13. As possibilidades de adoção nessa faixa etária são remotas, como ressaltou a ministra. Nos autos do processo, tampouco havia informação sobre possível adoção para os filhos.
“Entre um provável abrigamento até a maioridade e a possibilidade de acontecer uma reestruturação familiar, mesmo que mínima, como a ida dos menores para a casa dos pais aos finais de semana, quando o pai estiver presente, entendo que a última opção deva prevalecer”, afirmou.
O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul havia aceitado a destituição do poder familiar dos genitores. Proibiu ainda a retirada dos filhos, pelos pais, durante os finais de semana.
Representados pela Defensoria Pública estadual, os pais recorreram ao STJ por meio do recurso especial. Alegaram possível violação aos artigos 19, 23, 39 e 101 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O argumento também era de que não ficaram demonstradas as condições necessárias para ocorrer a destituição do poder familiar.
De acordo com a relatora no STJ, embora não fosse possível afastar a conclusão de que sob a tutela dos pais as crianças viviam em más condições de alimentação, educação e higiene, é inegável o forte vínculo afetivo entre todos eles.  A Defensoria Pública, segundo menciona a ministra, destacou as reiteradas tentativas do casal de restabelecer um convívio minimamente aceitável com os filhos.
Para a ministra, essas tentativas ficaram prejudicadas pela frágil condição psicológica da mãe. “Vindo daí o posicionamento do magistrado de piso no julgamento da ação, a proibir a retirada dos filhos, pelos pais, aos finais de semana, e somente permitir visitações sob supervisão. ”
Ao dar provimento ao Recurso Especial, Andrighi determinou que enquanto forem realizadas novas tentativas de retomada do convívio familiar, os jovens devem ser mantidos em abrigo – com o restabelecimento da possibilidade de retirada dos filhos, pelos pais, durante os finais de semana.
O entendimento da relatora foi acompanhado, por unanimidade, pelos ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva.
Repercussão
Especialista em direito da família, a advogada Renata Malta acredita que a decisão do STJ tenha tomado como base a ponderação sobre a determinação do ECA de que, para ocorrer a adoção, os irmãos deveriam ser adotados conjuntamente. “O que já é sabido, em razão das estatísticas existentes, é que dificilmente teríamos pessoas interessadas em adotar 4 irmãos adolescentes”.
Para ela, a idade dos irmãos também seria um empecilho na busca de um novo lar. “Novamente a estatística nos leva a afirmar que esses irmãos provavelmente não seriam adotados em decorrência da idade em que se encontram”, afirma. “Com isso, a destituição do poder familiar não atenderia ao melhor interesse dos menores, pois não os colocariam na posição de terem um novo lar, uma nova família. ”
Ela entende que a decisão da ministra foi correta ao ponderar que, apesar dos pais não apresentarem condições de manter uma família, na forma desejada e esperada, é possível que, mantendo o contato, possam amparar uns nos outros e com isso, vislumbra-se uma possibilidade de uma reestruturação familiar.
“Retirar uma família biológica sem ter outra família para ofertar a esses irmãos seria muito cruel”, avalia a advogada.
A advogada Marielle Brito, também especialista em causas relativas ao direito de família, avalia que deve-se prezar pela reunião familiar devido à idade dos filhos, que já não dependem tanto dos pais. Para ela, as relações afetivas e familiares são essenciais para a felicidade e devem se sobrepor a todos os outros interesses.
“Se os pais lutaram até aqui para continuarem com o poder familiar é porque mesmo com todos os problemas, doenças e dificuldades, não quiseram abrir mão dos filhos”, ponderou.
A advogada Renata Di Pierro, também especialista em direito de família, concorda. “Sem chance de serem adotados por uma família substitutiva, é melhor que eles continuem sendo filhos desse casal, com a chance de restabelecer o vínculo familiar”.
Para a especialista em direito de família, o caso julgado demonstra o quanto a morosidade do sistema Judiciário brasileiro atrapalha as decisões judiciais. “O pedido do Ministério Público foi feito quando os filhos eram crianças. O tempo de tramitação do processo fez com que as crianças ‘deixassem de ser crianças’, e então a ação perdeu seu objeto”, destacou a advogada.

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